A raiva constitui-se como uma emoção humana normal e habitualmente saudável. Os problemas
surgem quando se torna descontrolada e destrutiva, podendo afectar o trabalho, a escola, as relações
pessoais e a qualidade de vida no geral. O descontrolo leva a que te sintas “à mercê” de uma emoção
imprevisível e poderosa.
Definição de “raiva”
De um modo geral, a raiva define-se como um sentimento de protesto, insegurança, timidez ou
frustração, contra alguém ou alguma coisa, que se exterioriza quando o ego se sente ferido ou
ameaçado. A intensidade da raiva, ou a sua ausência, difere entre as pessoas. Alguns psicólogos
apontam o desenvolvimento moral e psicológico do indivíduo como determinante na maneira como a
raiva é exteriorizada.
Este sentimento pode ser despoletado por acontecimentos externos e internos. Pode ficar-se
zangado/com raiva em relação a uma pessoa específica (p.e. um colega) ou acontecimento (p.e.
engarrafamento no trânsito). A raiva pode ainda ser causada por preocupação excessiva ou
focalização nos problemas pessoais. As memórias de acontecimentos traumáticos ou marcantes
também podem desencadear esta emoção.
Sinais de alerta
Quando as pessoas ficam com raiva, tendem a experienciar variados pensamentos, sentimentos e
reacções físicas. Para alguns, os sentimentos tornam-se tão arrebatadores que parecem estar
“prestes a explodir”. Outros podem não saber que estão muito zangados com a situação, mas
sentem-se doentes, culpados ou reagem exageradamente a outras situações.
Seguidamente são apresentadas algumas expressões directas e indirectas de raiva.
Sinais directos: elevação do volume da voz, praguejo, dores de cabeça, dores de estômago, aperto
na garganta, aumento do ritmo cardíaco, aumento da pressão sanguínea, punhos cerrados, ameaças,
violência, pressão, hostilidade, fúria, ressentimento.
Sinais indirectos: excesso de sono, fadiga crónica, ansiedade, entorpecimento, depressão,
aborrecimento, exagero, perda de apetite, choro, crítica constante, piadas más ou hostis, abuso de
álcool ou drogas.
Muitas pessoas experienciam estes sinais gerais de raiva. Saber identificá-los constitui-se como o
primeiro passo para melhor lidar com eles. Alguns sentimentos e pensamentos ocorrem quando a
raiva surge; outros surgem à medida que a raiva aumenta.
De modo a identificar de que modo os teus sintomas se desenvolvem, tenta pensar em situações
passadas em que te parece que a raiva esteve presente e tenta recordar que sentimentos e
pensamentos a acompanharam. Será bastante útil pensar em situações em que experienciaste
diferentes níveis de raiva, de modo a melhor compreender como os teus sentimentos, pensamentos e
sintomas físicos se foram modificando.
Formas de expressar raiva
A maneira mais natural e instintiva de expressar raiva é através de respostas agressivas. A raiva é
uma resposta natural, adaptativa a ameaças; desencadeia sentimentos e comportamentos
poderosos, frequentemente agressivos, que te permite lutar ou defender quando és atacado/a. Uma
certa quantidade de raiva é, portanto, necessária para a nossa sobrevivência.
Por outro lado, não podes descarregar em cada pessoa ou objecto que te irrita ou chateia; as leis,
normas sociais e senso comum estabelecem limites à expressão da nossa raiva.
As pessoas servem-se de uma variedade de processos, conscientes e inconscientes, para tentar lidar
com estes sentimentos de um modo eficaz e socialmente adequado. Três deles são seguidamente
destacados:
• Expressar os sentimentos de raiva de um modo assertivo (e não agressivo). Tal implica
apresentares claramente as tuas necessidades e como podem ser satisfeitas, sem prejudicar
os outros. O respeito do próprio e dos outros é regra de ouro!
• Suprimir os sentimentos. Isto acontece quando reténs a raiva, deixas de pensar nela e te
focalizas em coisas positivas. O objectivo é inibir a raiva e convertê-la em comportamentos
mais construtivos. O perigo é que, ao não permitir a expressão externa da raiva, ela se vá
expressar internamente (p.e. hipertensão, depressão).
• Acalmar/relaxar. Isto implica, não só controlares a expressão do comportamento mas
também as respostas internas. Em última instância, também os sentimentos são “amenizados”.
Não ser capaz de expressar adequadamente os sentimentos de raiva pode gerar outros problemas.
Concretamente, pode levar a expressões patológicas da raiva, tais como comportamento
passivo-agressivo ou uma atitude perpetuamente cínica e hostil. As pessoas que rebaixam
constantemente os outros, que criticam tudo e que fazem comentários cínicos, não aprenderam a
expressar a sua raiva de um modo construtivo. Habitualmente, são pessoas com poucos
relacionamentos satisfatórios.
Mas atenção! Isto não se deve constituir como desculpa para “pores tudo cá para fora”. Algumas
pessoas podem usar estas ideias como licença para magoar os outros e isso pode ser bastante
prejudicial. Os estudos mostram que esta “explosão” pode fomentar ainda mais a agressividade e
raiva, para além de não te ajudar a resolver a situação.
Deste modo, é preferível saberes o que despoleta a raiva e, posteriormente, desenvolveres
estratégias que impeçam a escalada prejudicial dos sentimentos.
Formas de lidar com a raiva eficaz e autonomamente
Só é possível delinear e recorrer a estratégias eficazes se se conhecerem em pormenor os contornos
da experiência de raiva: o que penso? o que sinto?. O objectivo destas estratégias não é erradicar
totalmente as manifestações de raiva do teu repertório comportamental. O que teria acontecido se os
nossos antepassados não tivessem recorrido à agressividade para sobreviverem nos tempos em que
vigorava a “lei do mais forte”? Assim, o que se pretende é que consigas fazer um discernimento
racional das situações em que a raiva pode ser adaptativa e que mantenhas o controlo!
Lidar com sentimentos e pensamentos
Quando pensas em situações que te provocaram raiva, é provável que também te recordes de
sentimentos intensos de raiva, tão avassaladores que te levaram a agir de modos que não
melhoraram a situação.
Para melhor compreenderes e controlares estes sentimentos, é necessário analisar um outro aspecto
destas situações: os teus pensamentos.
Etapa n.º 1: Analisa. Da próxima vez que te chateares com alguma coisa ou alguém, procura reter
os pensamentos que te surgiram acerca daquela situação ou pessoa. Assim que possível, aponta-os
e, ao longo do tempo, faz uma listagem com vários destes pensamentos.
Etapa n.º2: Avalia. É importante que avalies cuidadosamente os teus pensamentos. São
precisos/exactos ou distorcidos? Os pensamentos distorcidos são inapropriados ou inexactos e
podem assumir várias formas, nomeadamente:
• Rotulagem: atribuição de um rótulo negativo sem considerar outras hipóteses ou
evidências. P.e. “Ele é um idiota”.
• Maximização: quando se avalia alguém, maximiza-se a componente negativa e
minimiza-se a positiva. P.e. “A minha professora deu-me uma nota baixa, ela é tão injusta” (mas
também te deu várias notas positivas).
• Personalização: acreditar que os outros estão a reagir directamente contra ti, sem
considerares quaisquer explicações mais plausíveis para o seu comportamento. P.e. “Aquele
rapaz é frio porque se acha superior a mim” (se calhar, esse rapaz recebeu foi notícias
negativas da sua família…).
• Visão em túnel: apenas os aspectos negativos da situação são considerados. P.e. “O
meu professor não consegue fazer nada bem. É crítico, insensível e não dá bem a matéria”.
• Pensamento “tudo ou nada”: a situação é encarada apenas segundo duas categorias e
não num contínuo. P.e. “O meu amigo não concorda comigo nesta questão por isso ele não me
apoia em nada”.
• Estar certo: tentas continuamente provar que as tuas opiniões e acções são as correctas.
Estares errado/a é impensável. P.e. “Gritar para a minha colega foi totalmente justificado. Ela
mereceu-o pelo que fez”.
Etapa n.º 3: Encontra outras formas mais adaptativas de pensar sobre a situação. Para cada
pensamento distorcido, tenta encontrar uma forma alternativa, mais adaptativa e que não te faça
sentir tão zangado/a. Isto pode envolver a exploração dos aspectos positivos de uma pessoa ou
situação, identificar outras razões possíveis para o comportamento da pessoa, ou olhar de um modo
“mais abrangente” para a situação.
Etapa n.º 4: Praticar as etapas anteriores. Esta análise deve ser praticada todos os dias de modo a
ser eficaz. À medida que se torna mais fácil, ficarás mais competente na identificação dos teus
pensamentos perante uma situação que te provoque raiva. Ao identificar pensamentos distorcidos e
substituí-los por outros mais adaptativos, podes evitar ficar tão “imerso/a” na raiva.
Lidar com sintomas físicos
O conselho mais comum quando estamos perante alguém muito zangado é “Tem calma” ou “Relaxa”.
Estas afirmações pretendem responder aos sintomas físicos da raiva, os quais geram tensão no
corpo ao ponto de parecer prestes a explodir. Aprender como relaxar pode ajudar-te a melhor
controlar os sinais físicos da raiva.
Respiração profunda: quando te sentes enraivecido/a, é importante dispores de uma técnica de
relaxamento que funcione rapidamente e em qualquer situação. A respiração profunda é exemplo
disso e permite que o organismo absorva mais oxigénio, para além de diminuir o ritmo cardíaco e
evitar que a adrenalina chegue tão rapidamente à corrente sanguínea. Esta respiração é profunda
porque envolve a área do estômago ou diafragma, e não o peito. É rítmica e lenta.
Ao detectares alterações físicas indicativas de sentimentos de raiva, pára um momento e focaliza-te
na tua respiração: habitualmente, será rápida e superficial. Se quebrares este ciclo e voluntariamente
começares a respirar lentamente e pelo diafragma, o organismo irá responder e as alterações físicas
serão amenizadas. Os músculos começam a relaxar e a sensação de tensão a diminuir.
Esta breve pausa pode também dar-te a oportunidade para te recompores, controlares os teus
sentimentos, mudares os teus pensamentos e lidar com a situação de um modo mais eficaz.
Relaxamento muscular progressivo: esta técnica envolve a contracção e relaxamento sistemático
dos principais grupos musculares do corpo. Esta técnica pode ajudar-te a localizar áreas no teu corpo
que estão tensas ou presas e, seguidamente, relaxá-las. Aplicada à situação que evoca raiva, pode
ajudar a diminuir tais sentimentos, assim como a ficares mais relaxado/a e menos zangado/a quando
a situação terminar.
No texto “Aprender a Relaxar”, também disponibilizado na secção Textos de Auto-Ajuda, poderás
obter mais informações acerca desta técnica.
Trabalho psicoterapêutico
Se as sugestões anteriormente apresentadas não te ajudarem a lidar com a raiva de um modo mais
eficaz ou se tiveres um problema de controlo sério, aconselhamos-te a procurares a ajuda de um
psicólogo (o GAPsi é uma opção viável nesse sentido).
A etapa mais importante é encontrar alguém que te ajude a sentir mais controlado/a. Falar com
alguém pode ajudar a prevenir que situações perigosas ou prejudiciais ocorram. A psicoterapia pode
também ajudar-te a sentires-te melhor contigo e a melhorares as suas competências comunicativas e
de relacionamento com os outros.
The Student Counseling Virtual Pamphlet Collection, http://counseling.uchicago.edu/vpc/ e
www.apa.org/topics/controlanger.htlm
traduzidos e adaptados por Ana Martins, Psicóloga Estagiária do GAPsi – Gabinete de Apoio Psicopedagógico
2009
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