A Doutrina das Quatro Idades (excerto)
Quinta-feira, Novembro
15, 2007
1:53 PM Publicada por LEGIÃO VERTICAL
Etiquetas: Citações , Doutrina
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Se
o homem moderno, até a uma época ainda muito recente, concebeu o
sentido da história como uma evolução e o exaltou
como tal, o homem da Tradição teve consciência de uma verdade
diametralmente oposta a esta concepção. Em todos os antigos testemunhos
da humanidade tradicional pode-se encontrar sempre, de uma forma ou
doutra, a ideia de uma regressão, de uma «queda»: de estados
originários superiores, os seres teriam descido a estados cada vez mais
condicionados pelo elemento humano, mortal e contingente. Este processo
involutivo teria tido o seu início numa época muito recuada. O termo
èddico ragna-rökkr, «crepúsculo dos deuses»,
é o que caracteriza melhor esse processo. E não se trata de um
ensinamento que no mundo tradicional tenha sido expresso de uma forma
vaga e genérica: pelo contrário, foi explicitado numa doutrina orgânica,
cujas diferentes expressões apresentam em grande medida
um carácter de uniformidade: na doutrina das quatro idades. Um processo
de decadência gradual ao longo de quatro ciclos ou «gerações» — é este,
tradicionalmente, o sentido efectivo da história, e por isso também o
da génese do que nós chamamos, num sentido
universal, «mundo moderno». Esta doutrina poderá portanto servir de
base às considerações que se seguirão.
A forma mais conhecida da doutrina das quatro idades é a própria da tradição greco-romana. Hesíodo fala precisamente de quatro idades, assinaladas pelos metais ouro, prata, bronze e ferro, inserindo depois entre as duas últimas uma quinta era, a era dos «heróis», que contudo se verá ter só o significado de uma restauração parcial e especial do estado primordial. A tradição hindu tem a mesma doutrina, sob a forma de quatro ciclos chamados respectivamente satyâ-yuga (ou kortâ-yuga), tretâ-yuga, dvâpara-yuga e kali-yuga (que quer dizer «idade obscura»), juntamente com a imagem do desaparecimento progressivo, no decorrer destes ciclos, de cada um dos quatro pés ou apoios do touro que simboliza o dharma, a lei tradicional. A redacção irânica está próxima da helénica: as quatro idades são conhecidas e assinaladas pelo ouro, prata, aço e uma «liga de ferro». O ensinamento caldeu repete este ponto de vista quase nos mesmos termos.
Em particular, mais recentemente encontra-se a imagem do carro do universo como uma quadriga que, conduzida pelo deus supremo, é puxada numa corrida circular por quatro cavalos que representam os elementos: as quatro idades correspondem à sucessiva predominância de cada um desses cavalos, que então arrasta consigo os outros, segundo a natureza simbólica, mais ou menos luminosa e rápida, do elemento que esse cavalo representa. Embora numa transposição especial, reaparece a mesma concepção na tradição judaica, na profecia que fala de uma estátua resplandecente, com a cabeça de ouro, em que o peito e os braços são de prata, o ventre e as coxas de cobre e as pernas e os pés de ferro e argila: estátua esta que representa, nas várias partes divididas desta maneira, quatro reinos que se sucedem a partir do reino áureo do «rei dos reis» que recebeu «do deus do céu potência, força e glória». Se em relação ao Egipto já se conhece a tradição referida por Eusébio sobre três diferentes dinastias, formadas respectivamente por deuses, semideuses e manes, aqui pode ter-se o equivalente das três primeiras idades — da do ouro à do bronze — de que falámos acima. Igualmente, se as antigas tradições aztecas falam de cinco sóis ou ciclos solares, em que os primeiros quatro correspondem aos elementos e nos quais se vê figurarem, tal como nas tradições euro-asiáticas, as catástrofes do fogo e da água (dilúvio) e as lutas contra os gigantes que veremos caracterizarem o ciclo dos «heróis» acrescentado por Hesíodo aos outros quatro, também se pode reconhecer aqui uma variante do mesmo ensinamento de que, por outro lado, noutras formas e mais ou menos fragmentariamente, se podem encontrar reminiscências também entre outros povos.
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